A Glória de Deus no Chamado para Pregar às Nações

Analisando os versículos 9-10, (Jr cap.1)percebemos que tocando na boca do jovem, Deus simboliza a comunicação de sua mensagem. Agora o Senhor proclama sua mensagem às nações tendo Jeremias por arauto. Para transmitir esta mensagem, Deus usa metáforas baseadas na agricultura e na construção, constituída por três pares de verbos, os dois primeiros negativos e o terceiro positivo: o profeta deve arrancar e derribar, destruir e arruinar para então edificar e plantar (Jr 1.10). Toda a corrupção na nação deve ser arrancada e derrubada, e somente depois disto é que se pode edificar e plantar de novo. Portanto, a mensagem do profeta teria duas funções. Em primeiro lugar, essa mensagem era uma declaração sobre a maldição da aliança que seria executada em seu devido tempo (Dt 28.1-68). Em segundo lugar, as bênçãos da aliança se tornariam realidade. Deus quer renovar, reconstruir e restaurar seu povo, mas antes da renovação é necessária a remoção radical do pecado e da infidelidade à aliança e eleição. A ruína é inevitável, enquanto a nação persistir no pecado, mas a palavra de renovação oferece esperança de restauração. Usando a linguagem do Novo Testamento, Deus tem primeiro de remover o pecado, antes de o pecador começar a crescer na graça e no conhecimento de Jesus Cristo.

Jeremias, entretanto, é humano. Ele reage inicialmente com medo e inadequação. São reveladas então a Jeremias duas visões inaugurais, descritas nos versículos 11-13. A primeira é a de "uma vara de amendoeira" (Jr 1.11). Em hebraico, a palavra "amendoeira" (shaqéd) e o verbo "eu velo sobre" (shoqéd) têm som semelhante. Há um jogo de palavras aqui que ilustra a prontidão com que Deus cumpre suas promessas. Sempre que o profeta visse a cada primavera uma amendoeira em flor, ele seria lembrado de que o Senhor está observando para assegurar que sejam cumpridas todas as palavras transmitidas em seu nome (Jr 1.12). A segunda visão tinha um tom mais sinistro, "uma panela ao fogo" (ou "fervendo"), literalmente uma panela sobre a qual alguém sopra, e cuja boca se inclina do Norte, indicando que seu conteúdo se derrama em direção ao sul (Jr 1.13). Essa visão indica a invasão babilônica, que virá do norte (Jr 20.4).

Percebemos nos versículos 14-16 que o exército da Babilônia executará o propósito de Deus de punir a idolatria de Judá e a quebra da aliança do Sinai. O verbo qtr, "queimar incenso" (Jr 1.16), é usado em outras passagens significando queimar a gordura dos sacrifícios (cf. 1Sm 2.16; Sl 66.15). A tensão entre o culto aos ídolos e a adoração exclusiva ao Senhor chegaram ao clímax. A guerra viria para interromper um modo de vida inútil, impuro e indolente, obrigando o povo a voltar seus olhos para o que é essencial e eterno. Mas Jeremias não vai trazer o fim por meio da espada ou da ação política. Ele é chamado a proclamar a palavra do Senhor quantas vezes for necessário, custe o que custar, e um alto preço será exigido dele.

Aqueles chamados ao ofício de anunciar a Palavra de Deus não são chamados a trocar a mensagem da aliança pelo discurso político. Nenhuma ideologia é absoluta e nem pode ser confundida com o evangelho. Sempre que a igreja ou mesmo pastores e teólogos identificaram determinada ideologia com o reino de Deus ou com a mensagem bíblica, essa foi não apenas distorcida, mas acabou sendo perdida.

 Portanto, a preocupação primeira daqueles chamados a anunciar a Palavra de Deus não é tanto com a mudança da sociedade civil, mas com a reforma e renovação da igreja por meio da mensagem de Deus. Aqueles chamados ao ofício de anunciar a palavra de Deus não são chamados para lidar com aqueles que ouvem e se submetem à mensagem profética como se fossem problemas. É fácil reduzir as pessoas a problemas, pois na maior parte das vezes é fácil solucionar esses problemas. Mas os profetas são chamados a conduzir as pessoas dos ídolos a Deus, da rebelião para a aliança, por meio da Palavra, da adoração e da oração. Aqui somos meros instrumentos nas mãos de Deus. As pessoas não devem ser vistas como problemas em busca de solução, mas como pecadores que podem ser renovados à imagem de Deus. Portanto, a vocação é sobre conduzir as pessoas a Deus, por meio de sua Palavra, em humildade. Trata-se de permanecer junto ao povo.

A tentação à qual os profetas estão sujeitos é considerar Deus uma mercadoria, utilizá-lo para legitimar a idolatria (cf. Jr 23.21-40). Qual é, então, o conteúdo da mensagem profética? Deve-se conhecer o Senhor (Jr 8.7; 24.7; 31.31-34). Este conhecimento se dá por meio do Messias, o Renovo Justo, descendente de Davi, que executa juízo e justiça na terra (Jr 33.14-18), a fonte de águas vivas (Jr 2.13), o bálsamo de Gileade (Jr 8.22), o Bom Pastor (Jr 23.4), o Renovo Justo (Jr 23.5), o Senhor justiça nossa (Jr 23.6), aquele que trará a nova aliança (Jr 31.31-34). E este novo conhecimento redunda em preocupação pelo aflito e necessitado e na prática da justiça e retidão.

A mensagem profética é o convite para "voltar" (Jr 4.1-2; cf. 9.24; 22.2, 13, 15; 

23.5; 33.15). Este termo e seus cognatos foram usados quase cem vezes neste livro e são o significado literal da palavra "arrependimento". Implica voltar-se dos próprios caminhos para a aliança (Jr 6.16), é um chamado à comunidade para um retorno à "verdade", "juízo" e "justiça". Em suma, o povo é chamado ao arrependimento e ao conhecimento de Deus por meio do Messias. E o remédio de Deus para o coração enfermo (Jr 17.9) será gravar sua lei no coração da nova comunidade (Jr 31.31-34). Portanto, o verdadeiro profeta é aquele que procura distanciar o povo do mal, enfatizando as exigências de Deus na aliança (Jr 23.14, 22).

Franklin Ferreira

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